Sem comentários
O PRESENTE DE PAPAI NOEL - AST 50x60 (Paulo Jorge)

“Eu não sei se vem de Deus, do céu ficar azul” — diz o compositor Djavan em sua canção “Azul”. No refrão da canção “Azul da cor do mar”, Tim Maia sugere que a pessoa deve “Ver na vida algum motivo pra sonhar. Ter um sonho todo azul — Azul da cor do mar”. Outros compositores também enaltecem a beleza da cor azul. Como representar o azul do mar? Como pintar o azul do céu? São desafios a serem enfrentados por artistas que pintam paisagens, principalmente pela complexidade em trabalhar com os pigmentos azuis.

A cor azul

O azul é uma das três cores primárias, com o magenta e o amarelo. O azul é o “ciano”, cor da mesma família, com tonalidade mais clara. No artigo “CORES COMPLEMENTARES E PALETA OTIMIZADA” (https://www.paulojorge.art.br/cores-complementares-e-paleta-otimizada/) propomos a substituição do ciano pelo “azul de cobalto”, por ter o segundo menos brilho do que o primeiro, proporcionando tonalidades mais atenuadas em suas mesclas.

A cor azul tem uma longa e interessante história que remonta a milhares de anos. Originada a partir dos pigmentos naturais encontrados no “lapis lazuli“, uma pedra semipreciosa, o azul era inicialmente associada à realeza e à divindade em várias culturas antigas, como egípcios e mesopotâmicos.

Ao longo dos séculos, o azul se tornou cada vez mais popular na arte e na moda, sendo utilizado em pinturas famosas e em tecidos de luxo. Com a descoberta de novos pigmentos azuis, como o azul ultramarino, a cor se tornou mais acessível e difundida na sociedade.

Atualmente, o azul é uma cor amplamente utilizada em diversas áreas, simbolizando tranquilidade, frescor e confiança. É uma cor presente em bandeiras, logotipos de empresas e é frequentemente associada ao céu e ao mar. A sua história é rica e diversificada, refletindo a importância cultural e emocional que o azul tem para a humanidade.

Na pintura, o azul leva a sensação de frio aos ambientes que a contém. Toda mescla que tende ao azul também é considerada “cor fria”.

Os pigmentos azuis mais usados nas pinturas

Até a metade do século XIX alguns pigmentos azuis começaram a ser sintetizados, como o azul da Prússia (PB27)azul-cobalto (PB28) e azul ultramar (PB29), segundo o autor João Barcelos. Há indícios históricos de que a busca por substitutos sintéticos se deu inicialmente por motivo econômico, uma vez que os pigmentos naturais eram muito caros.

1) Azul da Prússia (PB27), o acidente que deu certo

O azul da Prússia foi descoberto por acidente.  Em 1704, em Berlim, o químico e pintor Heinrich Diesbach tentava produzir um pigmento vermelho, numa experiência sobre oxidação do ferro. Por impurezas nas substâncias utilizadas, o pigmento tornou-se azul.

A receita era um segredo de negócio, mas em 1724 tornou-se conhecida. Químicos ingleses passaram a produzir o produto e vendê-lo sob o nome de Prussian blue, isto é, “azul da Prússia”, por ser o colorante empregado no tingimento dos tecidos dos uniformes militares prussianos.

Nas artes plásticas, o azul da Prússia é amplamente utilizado em diversas técnicas, especialmente na pintura a óleo, aquarela e acrílica, por ser mais barato do que o caro azul ultramar (produzido a partir do lapis lazulli). Sua tonalidade varia de um azul-escuro intenso a um azul acinzentado, o que o torna uma escolha popular entre os artistas para criar sombras, profundidade e contrastes em suas obras. Além disso, o azul da Prússia também é valorizado por sua resistência à luz e durabilidade, tornando-o uma escolha confiável para artistas que buscam cores duradouras em suas criações.

2) Azul ultramar (PB29), a beleza dos nobres

O azul ultramar natural é derivado do lápis-lazúli, uma pedra semipreciosa encontrada na China, Pérsia e Tibete. O azul ultramar foi usado como pigmento na área ao redor do Afeganistão já no século VI. Após a bem-sucedida síntese do ultramarino artificial em 1828, o ultramarino natural, extremamente caro, foi rapidamente substituído pelo produto artificial mais barato. Em poucos anos, fábricas para produzir ultramarino foram abertas na França, Inglaterra, Bélgica e Estados Unidos. O produto sintético custa uma fração do produto orgânico, o que viabilizou seu uso em diversos setores, incluindo as artes plásticas.

3) Azul cobalto (PB28), uma alternativa inovadora

O azul-cobalto (PB28) se destaca como um pigmento de beleza inigualável, ostentando uma rica história que se entrelaça com a busca incessante por cores vibrantes e acessíveis no universo das artes plásticas. Sua trajetória remonta ao ano de 1802, quando pesquisas incansáveis ​​buscavam uma alternativa mais econômica ao azul ultramar, um pigmento extraído do “lápis lazuli” e conhecido por seu alto custo.

Após anos de dedicação, em torno de 1820, os esforços finalmente se concretizaram: o método de produção do azul-cobalto se simplifica, abrindo caminho para a comercialização deste pigmento inovador sob o nome que hoje o identifica. Sua popularidade entre os artistas rapidamente se consolidou, não apenas pela beleza de sua tonalidade vibrante, mas também por sua estabilidade e resistência ao tempo, características essenciais para garantir a longevidade das obras de arte.

4) Azul cerúleo (PB35), tonalidade celeste com reputação injusta

O azul cerúleo (PB35) foi primeiro sintetizado em 1805, segundo a fonte colourlex.com (https://colourlex.com/project/cerulean-blue/), também derivado do cobalto. Utilizado nas artes plásticas desde 1860, na França, este pigmento recebe a denominação “azul-celeste”, encantando artistas com sua tonalidade celeste e vibrante. No entanto, um paradoxo intrigante se apresenta: apesar de sua beleza e do mesmo elemento em sua composição, o azul cerúleo ostenta um preço consideravelmente elevado (séries 5 ou 6), contrastando com o azul-cobalto.

É importante ressaltar que a reputação injusta do azul cerúleo como pigmento de baixa qualidade se deve, na maioria, à instabilidade de outros pigmentos da época, e não necessariamente às suas próprias propriedades. A implementação de testes de permanência no século seguinte finalmente contribuiu para esclarecer essa questão, permitindo aos artistas avaliar com segurança a qualidade dos pigmentos antes de utilizá-los.

5) Azul Ftalo (PB15), um mar de possibilidades nas artes plásticas

O azul ftalo (PB15:0, PB15:1, PB15:3, PB15:4), também conhecido como azul monastral ou azul de ftalocianina, ostenta um lugar de destaque na paleta de cores dos artistas há décadas. Sua rica história, propriedades únicas e versatilidade o tornaram um pigmento essencial para diversas técnicas artísticas, desde a pintura tradicional até a arte contemporânea.

Foi desenvolvido primeiramente como um pigmento em meados dos anos 1930. Sua descoberta despertou o interesse da comunidade artística devido à sua cor vibrante e intensa, variando de tons médios a escuros, com um subtom ligeiramente esverdeado. Sua opacidade semi-translúcida permite a criação de efeitos de velatura, enquanto seu moderado poder de cobertura facilita a mistura com outras cores, abrindo um leque infinito de possibilidades criativas.

Artistas renomados, como Pablo Picasso, Henri Matisse e Marc Chagall, abraçaram o azul ftalo em suas obras, explorando suas nuances e potencial expressivo. Sua presença marcante em diversas obras-primas consolidou sua posição como um pigmento essencial na história da arte.

O azul na pintura de paisagens

CREPÚSCULO NO CAIS

CREPÚSCULO NO PORTO – AST 40 x 60 (Paulo Jorge) Coleção particular

Na obra CREPÚSCULO NO PORTO, que pintei em 2020, usei praticamente todos os azuis que tratamos nesse artigo.

No mar, as sombras e reflexos contém azul da Prússia. A parte mais clara, à frente do barco, foi pintada com azul-cobalto, enquanto o tom esverdeado e transparente da água foi conseguido com o uso do azul ftalo, aplicando a técnica de velatura ou pintado com tinta sem diluição.
O uso de azul em primeiro plano ao pintar marinhas deve seguir alguns critérios. Como regra bastante utilizada, o que está em primeiro plano deve transmitir a sensação de calor, enquanto os planos mais distantes transmitem a sensação de frio. Respeitei esse critério, mesmo se tratando de um pôr do sol, onde se sabe que onde está o sol estará o calor, todavia, há pinceladas em tons de vermelho e laranja no primeiro plano. No horizonte, nas regiões próximas ao sol, o calor é irradiado e representado por tons alaranjados, tanto no mar como no céu, porém, as áreas mais afastadas contém somente azul. Há artistas que não usam azul em primeiro plano em hipótese nenhuma.
Para pintar o céu sem pôr do sol não há grandes dificuldades. Geralmente é mais claro próximo ao horizonte, com tendência mais quente (contendo vermelho ou amarelo na mistura, em pequena quantidade). Vai escurecendo à medida que se distancia do horizonte, podendo terminar com azul ultramar. Já quando pintamos um crepúsculo, devemos tomar algum cuidado com os reflexos. O sol é branco, com halo amarelo. Para fundir o amarelo com o azul não é tão fácil como pode parecer, pois podemos chegar ao verde (que não é desejável). A solução é usar o laranja entre o amarelo e o azul. Com isso evitamos o verde, já que o laranja contém vermelho e se funde muito bem com o azul, produzindo a transição desejada.
Na obra de minha autoria intitulada “O PRESENTE DE PAPAI NOEL” (capa deste artigo), também usei várias cores azuis. O uso do azul é sempre um desafio para o artista, mas produz obras que chamam a atenção dos observadores.

Referências

Compartilhe com seus amigos

Sobre o autor

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *